13 de jul. de 2010

A VIDA EM SLOW (Martha Medeiros)


Um texto um pouco longo para blog, mas não há como reduzir. Então, vai mudando de cor para ficar mais fácil de se ver.:)
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A VIDA EM SLOW


Nem a encrenqueira Jabulani, nem o performático Maradona, nem o belo gol de corpo inteiro que Luis Fabiano marcou contra a Costa do Marfim.
O que mais atraiu minha atenção nessa Copa foram as cenas em slow motion.

Aliás, very slow, passando a sensação de que a vida pode ser delicada em qualquer circunstância.

Até mesmo o atrito violento entre os corpos ganha suavidade e nada parece doer. Nada. Não há quem não se deslumbre com o balé de imagens desse mundo que, quando em rotação normal, é fast demais.

Sempre fui fascinada por cenas em câmera lenta, principalmente quando utilizada para buscar a poesia onde nem pressupomos que ela exista. Lembro de um filme de guerra que mostrava em slow os soldados sendo atingidos por granadas, voando junto com os estilhaços ao som de rock pesado. Brutalidade embrulhada em papel de seda. Clichê ou não, funciona.

Tanto funciona que somos naturalmente obcecados pelas poucas imagens da vida que são slow ao natural, a olho nu. Você já reparou?

As ondas, por exemplo, jamais são apressadas. Elas se formam com vagar, como se soubessem que participam de um espetáculo, e depois quebram demoradamente, fechando-se em si mesmas, femininas, recatadas, soltando sua espuma e suas gotas em uma coreografia ensaiada que sempre extasia. Na beira da praia ou em alto-mar, em dia de calmaria e mesmo em dia de fúria, as águas nunca são aceleradas, elas sabem que são donas de um raro efeito especial.

A mesma coisa com transporte aéreo. A cidade pode estar em velocidade máxima, os carros zunindo pela avenida, pessoas correndo de um lado para o outro nas ruas, e então surge aquela espaçonave branca atravessando o céu, seja decolando ou aterrissando, num ritmo tão lento que custamos a acreditar que consiga se manter no ar sem despencar. Não despencam. Nem disparam. Mantém-se em slow. Planam, como pássaros que também são.

As girafas não impressionam apenas pela longevidade do pescoço, mas porque caminham num molejo baiano, não acompanham o frenesi da selva, não possuem pressa para nada, são majestosamente demoradas, assim como os elefantes, mas esses são pesados, há justificativa para a inatividade. Já as girafas poderiam voar de tão leves, tivessem asas e urgência de alguma coisa.

A paciência é o sentimento mais slow motion que cultuamos.

O fogo da lareira, a chama da vela, a fumaça do cigarro, a tragada: a vida queima em marcha lenta.

Os domingos caudalosos. O beijo apaixonado. Tão deliciosamente arrastados... assim como as reticências...

O resto é apressado demais.

(Autora: Martha Medeiros)






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